- Você não quer descer, né?
- Não. Eu não quero. Minha vontade era te abraçar, te por pra dentro e continuar exatamente do ponto em que parou 3 anos atras. Mas eu não posso mexer assim com você. Minha mente está um turbilhão, tudo anda muito confuso. Não posso, de novo, mexer com você e me arrepender amanhã. Você não merece, não posso te machucar mais uma vez.
- É estranho ouvir você falar em me machucar. Parece um conceito bastante distante do seu vocabulário.
- Não tenho a sua facilidade em admitir erros e pedir desculpas, mas não significa que eu não saiba que errei. Não devia ter te incluído na bagunça que estava minha vida.
- Não acredito tanto que tenha sido a questão da bagunça, dos desejos. Acredito mais na questão da razão que eu sempre debati. Tem muito mais de mim ai do que você de fato gostaria que tivesse.
- Essa é uma das coisas que eu menos gosto.
- O que? Gostar de mim? Ou eu não acreditar quando você diz que não?
- As duas coisas. Olha tudo que a gente viveu. Nunca foi um mar de rosas. Não é possível que você não tenha nenhuma má lembrança. Tantas brigas, tantas discussões, não é possível que eu nunca tenha te magoado. Que você não tenha medo de viver tudo de novo .
- Magoou sim. Nunca disse que não. Mas eu preferi guardar todas as vezes que me fez sorrir. Todas as vezes que esteve do meu lado quando ninguém mais estava. Todas as vezes que me ouviu, que me abraçou. Todas as vezes que me forçou a ser alguém melhor. Nunca fomos perfeitas, simplesmente porque a perfeição não existe. A perfeição, pra mim, é saber que se importa, que está pensando em mim, que tenho com quem contar, que podemos jantar fora, num restaurante caríssimo ou podemos sentar no porta-malas, ver o por do sol, comendo amendoim com uma cerveja barata. A perfeição, pra mim, é saber que, mesmo que não seja um dos melhores dias, a pessoa que eu amo está do meu lado e que ela também me ama. Eu ainda sou aquela romântica incorrigível. Se há amor, o resto a gente se ajeita.
- Mas você não tem medo?
- De que? De sofrer de novo? Nunca tive. Aceito os riscos porque a intensidade da felicidade dos bons momentos sempre vão ser superior. Ninguém morre de amor. De mais a mais, eu sei que aí há um sentimento. Medo eu teria se não tivesse essa certeza. Você pode negar, mas o jeito que você me trata é diferente.
- As vezes eu acho que você não tem noção do que ta falando, sabia? Que é da boca pra fora, que fala sem pensar.
- Talvez... mas você não fica incomodada com todo mundo que deixa a mão livre perto da sua enquanto dirige.
- Ah, então foi de propósito?
- Foi. E o clima ficou pesado. Perceptível o seu desconforto. Foi o que? Teve que cruzar os braços pra conter o impulso ou a naturalidade com que seguraria minha mão?
- Você tem noção que voltar exatamente de onde parou, significa voltar do pior período?
- Com 3 anos a mais de maturidade pra cada lado. Outros relacionamentos, outras histórias, outras tentativas. Uma suspensão que vira e mexe nos coloca de volta no mesmo lugar. Há quem diga que é uma história mal resolvida. Pode ser. Roda, roda, roda e caímos sempre no mesmo lugar. Independente do motivo, ninguém seguiu em frente. Houveram tentativas. Mas chegou um momento que você também, assim como eu, resolveu sentar e esperar. Desisti de procurar a pessoa que vai superar esse sentimento, que vai apagar essa lembrança. Resolvi, simplesmente, sentar e esperar. Uma hora alguma coisa acontece.
- Quer dizer que se eu te beijar agora e me arrepender amanhã, não vai te magoar?
- Vai, claro que vai. Vai doer sim, e nós duas sabemos que não respondo muito bem à dor. Vou ter os períodos de revolta, pode ser que fale o que me arrependa depois, pode ser que tente fazer com que você também sinta a minha dor. Ai posso me afastar, lamber as feridas, e voltar como se nada tivesse acontecido. Ou talvez não voltar. Tudo pode acontecer. E pode acontecer também de você me beijar hoje. E amanhã quiser de novo. E de novo. E a coisa crescer e virar namoro, noivado, casamento. Tudo pode acontecer.
- Ta certo. Olha, faz o seguinte, vou buscar o controle, você guarda esse carro, a gente entra pra conversar mais confortável, mais quentinho. Eu faço aquele chocolate quente e a gente termina esse assunto. Ou não. Só entra e deixa rolar.
Poderia ter seguido a história, mas era uma estória. A mudança aconteceu no momento em que não queria, mas desceu do carro...
Era, inicialmente, um conto. Mas a ideia foi interrompida.
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